A Companhia do Metropolitano de São Paulo (Metrô), empresa administrada pelo governo Geraldo Alckmin (PSDB), terá de explicar a diferença de R$ 1 bilhão entre o valor orçado para realização das licitações e os aditamentos contratuais feitos até 20 meses depois, para os oito lotes de obras de conclusão da Linha 5-Lilás do Metrô (Capão Redondo-Chácara Klabin). O conselheiro Antonio Roque Citadini, do Tribunal de Contas do Estado (TCE) de São Paulo, deu 60 dias para a empresa responder 92 questionamentos relativos aos processos que apuram possíveis irregularidades e desvio de recursos nas obras.
“Impressiona, na instrução processual, a ausência de clareza das informações prestadas pelo Metrô, gerando dúvidas inclusive a respeito da própria organização dos atos administrativos internos. Não é possível ter certeza sobre quase nada. A obra, dividida em lotes, parece se fundir. A ordem cronológica dos atos administrativos se mostra errática. É imperioso que alguma luz venha aos autos de sorte a permitir juízo de valor sobre os atos administrativos e da despesa praticados”, escreveu Citadini, no despacho dirigido à diretoria do Metrô.
Os problemas detectados pelos técnicos do tribunal se referem a diferenças entre os valores orçados, os valores definidos no ato de contratação e os aditados um ano e oito meses depois. Essas discrepâncias se dão por conta de centenas de alterações nos quantitativos de serviços – muitos foram aumentados e outros diminuídos – nos valores de cada ação e a inclusão de itens que não estavam previstos.
Todos os lotes apresentaram diferenças superiores a R$ 43 milhões entre o orçado para a licitação e o aditado 20 meses depois. A menor diferença ficou no Lote 1, cujo aditamento, 11 meses depois, chegou a R$ 43,9 milhões. As maiores ficaram nos Lotes 3 e 7, de R$ 284,4 milhões e R$ 267,7 milhões, respectivamente. Esses lotes ficaram a cargo dos Consórcios Andrade Gutierrez-Camargo Corrêa (Lote 3) e Metropolitano 5, formado por Odebrecht Engenharia e Construção Internacional S/A, Construtora Queiroz Galvão S/A e Construtora OAS S/A (Lote 7).
Por exemplo, no Lote 1, cuja licitação foi vencida pelo Consórcio Construcap-Constran, estavam previstas 15 unidades – medida não especificada em contrato – de obras de escavação manual para fundações, ao custo de R$ 44,67 cada – R$ 670 no total – em 1º de julho de 2008. Onze meses depois, o Termo de Aditamento (TA) Nº 2 estipulou 2.578,55 unidades do serviço, ao custo de R$ 38,54 – total de R$ 99.317. Já o item Demolição de concreto simples previa 58 unidades do serviço, ao custo de R$ 126 (R$ 7.308). O TA nº 2 descreve 977,38 unidades, ao custo de R$ 144,78 (R$ 141.505,08).
No Lote 2, vencido pelo consórcio entre as empresas Galvão Engenharia S/A e Serveng-Civilan S/A, em 1º de setembro de 2009, estavam previstas 580 unidades de perfuração para construção de colunas de sustentação, ao custo de R$ 81,89 (R$ 47.496). No TA Nº 3, em 1º de maio de 2011, passou-se a 16.229 colunas, ao custo de R$ 161,10 (R$ 2,6 milhões). A previsão era de que o lote todo custasse R$ 327,5 milhões. Mas 20 meses depois, o orçamento era de R$ 424,3 milhões.
Segundo Citadini, observadas as diretrizes do Tribunal de Contas da União (TCU), as alterações contratuais do Lote 2 alcançaram 40,05% a mais do que o orçado. O limite é de 25% de correção para mais ou para menos. O Metrô alegou ao TCE que os aditamentos chegaram apenas a 9,75% do valor.
O aumento de custos das obras, porém, não representou melhora na execução. O relatório do conselheiro Citadini destaca problemas no prazo de entrega de todos os lotes: o Lote 1, de construção da estação Adolfo Pinheiro, foi entregue com dois anos de atraso; outros lotes com execução distante da ideal para os prazos de entrega previstos. Confira a tabela abaixo:
Outro problema apontado pelo Tribunal de Contas é a falta de coordenação entre as contratações e execuções dos lotes. Por exemplo, os Lotes 3 e 7 são, em resumo, para a construção dos túneis entre as estações. Os demais consórcios, que vão construir estações e pátios, têm de esperar que as ações dos tuneladores – chamados tatuzões – terminem para iniciar os trabalhos deles. Mas todos foram contratados no mesmo tempo. “Não deveriam ter sido licitados em separado ou colocados antecipadamente aos outros?”, questionou Citadini.
Há ainda ações realizadas que não constam de nenhum edital de licitação. Dentre elas, um túnel de 400 metros, no Lote 1, entre a Estação Largo Treze a Estação Adolfo Pinheiro. “No objeto do edital não é citado nenhum túnel. Apenas foi colocado: poço Largo Treze e Vala a Céu Aberto, seguido de palavras como exclusive e/ou inclusive, o que trouxe uma imprevisão de limites e obras a serem executadas. Cabe ao Metrô esclarecer”, determinou Citadini.
Mesmo a construção de redes para o fornecimento de água e energia elétrica, que não sofreram alterações de quantidade, tiveram um grande aumento no valor previsto para a implementação do sistema. No Lote 3, o sistema de água mais que triplicou e o de energia elétrica aumentou cinco vezes, entre 1º de setembro de 2009 e 1º de maio de 2011. Embora distintos, ambos tinham o mesmo valor previsto, conforme se nota neste trecho do documento do TCE:
A Linha 5-Lilás começou a ser construída em 1998, quando era a Linha F da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM). O trecho em operação, entre Capão Redondo e Largo Treze, funciona desde 2002. Porém, a construção ficou parada até 2009 e, desde então, somente a estação Adolfo Pinheiro foi entregue. Alckmin já remarcou a data de inauguração das estações várias vezes, com a última previsão para 2018.
Em julho do ano passado, o governador Geraldo Alckmin anunciou a intenção de privatizar tanto o trecho em operação quanto o trecho em obras da Linha 5-Lilás. A expansão do trecho começou orçada em R$ 6,9 bilhões e atualmente tem previsão de custo de R$ 9,1 bilhões. Faltam ainda 11 estações, ligando a região de Santo Amaro à Chácara Klabin, na região Sudeste da cidade, em conexão com a Linha 2-Verde.
Além do problema com as obras, a gestão Alckmin adquiriu 26 trens novos para a Linha 5-Lilás, que estão parados desde 2013. Comprados por R$ 630 milhões, os trens vieram equipados com um sistema de operação diferente do utilizado na via. Várias composições estão paradas ao longo do trecho, outras no pátio Capão Redondo e outras no pátio Jabaquara.