Em discurso no final da tarde de terça-feira, dia 30, a senadora Gleisi Hoffmann acusou a misoginia do Congresso Nacional e o papel da mídia como decisivos para o processo de impeachment de Dilma Rousseff ter chegado a “este momento pífio do parlamento brasileiro”. Segundo ela, a improvável ascensão de uma mulher à presidência da República provocou reações dos círculos conservadores do país, por se tratar de “uma presidenta fora do círculo dominante, de esquerda, portanto, desajustada da normalidade que vem desde 1889, e ainda por cima mulher, e sem marido”.
Para Gleisi, o “enorme significado” da eleição da primeira mulher à presidência “em um país como o nosso” ainda não foi avaliado. “Mas são indispensáveis estudos sociológicos, teses e pesquisas para se saber do impacto profundo que isso teve entre as mulheres e os brasileiros mais pobres.”
Mais cedo, a senadora disse que a acusação, especialmente a advogada Janaína Paschoal, não usou argumentos técnicos e jurídicos, mas políticos. “Não tenho nada contra debates políticos”, afirmou, citando a advogada e seu colega de banca Miguel Reale. “Mas para fazer debate político é necessário que se submeta ao voto popular e venha para essa casa. Se aqui vêm como advogados, têm que trazer questões técnicas.”
A senadora rebateu o “argumento” da advogada, segundo a qual “foi Deus” que fez com que “várias pessoas percebessem o que estava acontecendo com o nosso país” e conferiu a elas “coragem para fazerem alguma coisa a respeito”.
“Doutora Janaína invocou Deus. Deus não tem nada a ver com esse golpe. Invocou os netos da presidenta, chorou. Isso aqui não é uma cena. Era importante que a acusação viesse aqui e colocasse os fatos jurídicos”, respondeu a petista.
No discurso da tarde, Gleisi disse que as acusações juridicamente infundadas contra Dilma, ironias de senadores e abordagem midiática revelam a misoginia e o preconceito. “A tentativa de derrubar a presidenta tem esse ingrediente: mandar a mulher de volta pra casa, de preferência para a cozinha. Ou não é expressivo e revelador o ministério 100% masculino do interino Michel Temer e o rebaixamento das estruturas ministeriais de promoção das mulheres? Ou a pauta midiática, bela, recatada e do lar?”, ironizou.
No discurso, ela afirmou que, historicamente, “os mais cínicos e despudorados pretextos” afastam do poder governos populares que avançam em conquistas sociais. “Em décadas passadas, com Vargas ou Goulart, ou nos anos recentes com Lula e Dilma, marretam o povo e suas tímidas conquistas. Ontem era o espectro do comunismo, agora é essa ridicularia de pedaladas e irresponsabilidade fiscal, devidamente fulminadas neste plenário, pela presidenta Dilma e pela brilhante defesa do advogado José Eduardo Cardozo”, disse.
Mídia
A senadora do Paraná acusou “os golpistas” de tentar afastar Dilma usando “o mais poderoso instrumento de propaganda, de intrujice e burla da opinião pública e fraude da verdade e da realidade, que é a mídia monopolista”.
Segundo a senadora, “uns poucos órgãos de comunicação deformam o entendimento popular, corrompem a capacidade do brasileiro de discernir, envenenam mentes, disseminam ódio e rancor”.
E acrescentou: “Tirante os clássicos regimes de exceção, nada se compara com o que a mídia produz nos dias de hoje, em termos de distorção, mentira, trapaça e escravização de opiniões. Isso terá um preço, porque essa submissão da opinião pública, essa ditadura dos meios de comunicação não dura para sempre. E o despertar do povo brasileiro pode despertar um enorme pesadelo para quem a instalou”.