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Depois e Saravá Brasil: bares mostram resistência e luta política

Estabelecimentos, que lutam para sobreviver em meio a pandemia da Covid-19, serão os parceiros do Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região na live ‘1º de maio solidário’ que acontece no sábado

Imprensa SMetal
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Mesmo com as portas fechadas, o Saravá arrumou uma forma de continuar defendendo seus ideais políticos

Mesmo com as portas fechadas, o Saravá arrumou uma forma de continuar defendendo seus ideais políticos

Em Sorocaba desde 1985 e na rua Cônego Januário Barbosa há 15 anos, o Depois Bar e Arte é um dos mais tradicionais espaços de cultura e entretenimento da cidade. Do público da década de 80, até os mais jovens que começaram a conhecer recentemente, um fato é que se trata de um local frequentado (e conduzido) por progressistas. O Saravá Brasil Bar é o caçula dessa história, mas já reúne um público variado em idade, gênero, raça e credo que, em vários momentos, se mostra posicionado pelas causas sociais. São dois espaços de resistência e luta política que hoje passam pela maior batalha de todas: a pandemia da Covid-19.

Somente na capital paulista, por exemplo, estima-se que pelo menos 12 mil bares e restaurantes tiveram que fechar as portas e se despedir dos frequentadores. O estudo, realizado pela Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel-SP), mostra que os reflexos da pandemia chegaram intensamente no setor que foi um dois mais impactados pelo coronavírus. Em todo o estado, 50 mil estabelecimentos encerraram suas atividades.

Esse impacto também foi registrado no Depois Bar e Arte, um dos parceiros que irá sediar a live ‘1º de Maio Solidário’, realizada neste sábado pelo Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região (SMetal). De acordo com Luciana Siedler, uma dos quatro sócios (que está na quarta geração do bar), nos últimos tempos o local arrecadou 15% do faturamento original que tinha antes do período pandêmico. Graças ao planejamento financeiro, ainda conseguiu se manter sem precisar recorrer a empréstimos ou incentivos como o Pronampe – que funciona como uma linha de crédito especial para ajudar micro e pequenas empresas com recursos financeiros.

O Depois foi um dos primeiros bares a fechar as portas em Sorocaba, ainda no dia 18 de março de 2020. Luciana recorda dos pensamentos que tiveram e de como tudo mudou. “Por tudo que acreditamos, fomos um dos primeiros bares a fechar. No começo, pensávamos que seria apenas por 20 dias se todos fizessem um esforço coletivo”, recorda. Assim como muitos brasileiros, a advogada também tinha esperança de que tudo passaria rápido. No entanto, o que duraria no máximo duas semanas, acabou se estendendo para meses.

Na retomada gradual do Plano São Paulo, o bar aderiu ao serviço de delivery com alguns pratos. Apesar do apoio de amigos e frequentadores que adquiriram os produtos, o retorno com a entrega de comida por aplicativos foi tímido e não representou grandes mudanças na situação financeira. Além dessa medida, o Depois também vendeu alguns vouchers que o público poderá, futuramente, usar em troca de bebidas, porções e outros itens do cardápio. Alguns desses vales já foram utilizados.

É que, ainda no final de 2020, os frequentadores puderam voltar à casa, que funcionou em horários alternados e com a capacidade reduzida, seguindo as regras e especificações do Plano SP. “Podíamos receber até 80 pessoas se levássemos em consideração os 40% de capacidade exigidos pelo governador, mas não achávamos seguro e operamos abaixo disso, em esquema de barzinho mesmo, com as pessoas sentadas nas mesas”, comenta Luciana Siedler.

Nesta nova fase, o Depois deve retornar o funcionamento com 25% da sua capacidade. Para complementar a renda, os sócios prepararam algumas ações, como venda de empadas e massas congeladas, “Tudo preparado por nós com muito amor pra tentar manter o Depois”, explica Luciana.

As lembranças de dias em que a casa chegava a receber 250 pessoas, e que todos podiam dançar e cantar sem as máscaras, causa saudade nos sócios, mas também no público. O metalúrgico Paulo César de Oliveira, 28, é um dos frequentadores que relata essa saudade. “Eu não tenho nem palavras para descrever a falta que sinto do Depois e do Saravá. Mas, diante desse cenário da saúde, sou muito feliz e grato por curtir espaços de pessoas que são tão responsáveis e compromissadas com a vida”, diz.

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Antes da pandemia, o local recebia centenas de pessoas para dançar e curtir as atrações musicais

Antes da pandemia, o local recebia centenas de pessoas para dançar e curtir as atrações musicais

Como Paulo César menciona, este é um momento de segurar a saudade mais um pouco, uma vez que o país vivencia uma segunda onda que se caracteriza como um dos piores momentos da pandemia e Plano Nacional de Imunização (PNI) avança a passos lentos. “Como se não bastasse estarmos vivendo uma crise de saúde, estamos passando por ela com um presidente que não se movimenta”, completa a sócia do Depois Bar e Arte.

Um pouco da vontade de poder ouvir as canções que embalavam às noites de final de semana poderá ser aliviada no próximo sábado, dia 1, na live solidária organizada pelo SMetal. Um dos artistas que tocam na transmissão é o cantor e compositor Júlio Moura, uma das principais atrações dos domingos no Depois, antes da pandemia.

Também fazem parte do line-up a dupla Luca e Marcelo, que tem o dirigente sindical eleito Marcelo José da Silva (Toyota), como um dos cantores. O Forró das Comadres traz a sanfona e a zabumba com as vozes de Fernanda Teka, Flor Maria e Vivi Moreno e, para finalizar, Flavinho Batucada e mais seis músicos tocam os clássicos do samba e pagodes inesquecíveis.

Do Frankie and Jay ao Saravá

Apesar de caçula, o Saravá Brasil Bar é um dos espaços mais queridos por diversos setores progressistas de Sorocaba. O que nem todos sabem é que sua história tem a ver com o Frankie and Jay, um estabelecimento que funcionava na Pandiá Calógeras onde, posteriormente, foi a primeira casa do Saravá.

O proprietário Andy Alves comenta que a ideia de criar um bar com música e comida brasileira já existia, mas a circunstância para o “nascimento” do que hoje conhecemos como Saravá Brasil Bar foi adversa. “Eu tinha um bar que chamava Frankie & Jay e, quando ele começou a ir mal, meu ex-sócio saiu e eu fiquei com a empresa atolada em dívidas, na ordem de R$ 200 mil. Eu precisava fazer algumas coisas e ideia de um bar de música brasileira já existia na minha cabeça até antes do Frankie & Jay. Imaginei que seria a hora de colocar em prática”, explica.

Desta forma, surgiu o Saravá em 2018. Com nome que faz referência a uma saudação presente na Umbanda e Candomblé, o espaço unia diversão, comidas e muita música, principalmente impulsionando o trabalho de grupos e artistas regionais como a Banda Saravá, Arroeira, Varal Estrela, Krucatá, Batucava Groove, Banda da Feira e tantos outros.

“Quando eu falei pra algumas pessoas que se chamaria Saravá, a grande maioria achou loucura: esse nome em uma cidade conservadora e tradicionalista como Sorocaba vai dar errado. Mas eu sabia que precisava de algo que fosse base do posicionamento que sempre tive e o local teria que expor e colaborar. À partir daí, juntar música com diversidade, questões raciais, inclusão, respeito, partindo desse princípio: mostrar que não tem diferença entre todos”, comenta o proprietário.

Rafael Benitez
O Saravá mudou de casa, mas o público acompanhou o estabelecimento

O Saravá mudou de casa, mas o público acompanhou o estabelecimento

Com as portas fechadas desde o começo da pandemia, Andy precisou recorrer a diversos empréstimos e medidas para que pudessem manter o posto de trabalho de 11 funcionários. Eles receberam seus salários até janeiro deste ano, quando, infelizmente, o Saravá já não conseguia segurar as pontas. “Hoje, mesmo que eu quisesse, não teria mais limite ou aprovação para linhas de crédito. Mesmo assim, com toda essa dificuldade, não faz sentido como gestor (e como ser humano) abrir agora. O duro é que isso impacta em muita coisa: foram 5 empréstimos, dois deles já em atraso; demissões, dívidas e acordos”, lamenta.

Assim como o Depois, durante o período de flexibilização, o bar teve um projeto paralelo para receber o público dentro das especificações que o governo do estado querida. Onde antes funcionava o estacionamento do Saravá – um terreno amplo e à céu aberto – nasceu o “Puxadinho”. O formato era diferente do conhecido pelos frequentadores da casa que estavam acostumados com dança e contato físico antes da pandemia, desta vez o local funcionava em formato de “barzinho” e tinha restrições quanto a capacidade de público, distanciamento de mesas e o uso das máscaras.

Segundo Andy, esse momento deu uma sobrevida financeira ao espaço, mas não foi o suficiente para frear os impactos da sequência de empréstimos e do que viria pela frente, em 2021, com a pandemia. Hoje, o Puxadinho já não funciona e o Saravá luta para sobreviver à crise sanitária no mundo.

Ação conjunta

O Banco de Alimentos de Sorocaba (BAS) é o grande beneficiado no 1º de Maio Solidário – Live Solidária, realizado pelo Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região. O evento organizado em comemoração ao Dia do Trabalhador e da Trabalhadora, vai reunir quatro bandas e artistas da cidade, em uma transmissão on-line, a partir das 10h, no Facebook e no Youtube.

Para Luciana Siedler, do Depois, a ação fortalece o posicionamento político do estabelecimento e gera uma onda solidária. “Eu sempre frequentei os eventos do Sindicato. Então acho importantíssima a ação, tanto para nós, quanto para o Saravá, porque nos dá uma grande visibilidade. O Depois nunca foi um bar ‘isentão’, então para nós, estarmos juntos neste evento com um órgão super importante para a sociedade, é um privilégio. Assim ajuda todo mundo: os bares, os artistas e os trabalhadores”, diz.

“Pra gente foi maravilhoso o convite! O Saravá tem se preocupado em tentar manter a marca viva. Já que sabemos que qualquer abertura precoce é perigosa, vamos nos manter fechados enquanto der. Nesse período, precisamos manter a marca viva, criar ações que beneficiem nosso entorno. Agora, essa junção de forças é o que fará que tenhamos mais forças para levar tudo isso enquanto for”, completa Andy Alves, do Saravá.

O presidente do SMetal, Leandro Soares, finaliza recordando o conceito de Sindicato Cidadão. “Compreendemos a importância do trabalho, mas o lazer e o entretenimento devem ser, também, pautas de uma entidade como a nossa. O Sindicato Cidadão somos todos nós. Esse fortalecimento entre os bares, os artistas e o Sindicato dos Metalúrgicos faz parte de um projeto que, para nós, é de extrema importância”.

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