Curitiba – O governador do Paraná, Beto Richa (PSDB), intensificou nos últimos dias a ofensiva contra a APP Sindicato, responsável pela organização da segunda greve dos professores das escolas públicas estaduais este ano. Na sexta-feira (29), Richa pediu o bloqueio das contas bancárias da APP. Ele quer impedir também o recolhimento das contribuições sindicais dos professores e funcionários associados à APP com o pretexto de garantir o pagamento de multa de R$ 1,24 milhão imposta à entidade referente aos dias parados na segunda greve dos professores deste ano. Poucos dias depois de deflagrada, a greve foi considerada abusiva pelo desembargador Luiz Mateus de Lima. Hoje (1º), enquanto isso, o governo lançou edital para a convocação de um número ainda indefinido de professores temporários.
“Beto Richa segue na linha que temos denunciado, de aplicar no Paraná um estado de exceção”, disse o presidente da APP Sindicato, Hermes Leão. “A intenção de uma medida como essa, da qual o sindicato dos agentes penitenciários também já foi alvo no passado, é inviabilizar nossa capacidade de mobilização e articulação da greve”, prosseguiu Hermes Leão ao falar sobre a tentativa de bloqueio de contas. Se a ação for acatada, a APP também teria dificuldade para honrar os compromissos com seus funcionários, acrescentou Hermes Leão.
O pedido do Palácio Iguaçu será analisado pelo mesmo desembargador que considerou abusiva a greve dos professores. Até o início da tarde de hoje, porém, a APP não havia obtido acesso a detalhes da ação e os advogados da entidade ainda aguardavam notificação formal. Um fato no mínimo curioso é que a APP recorreu da decisão do desembargador Luiz Mateus de Lima sobre a abusividade da grave, mas até agora o recurso não foi julgado.
Em outra iniciativa contra os grevistas, o governo paranaense formalizou hoje a abertura de inscrições para contratar milhares de professores temporários para substituir provisoriamente os servidores em greve. Não há um número fechado sobre quantos professores serão realmente chamados e é possível que o edital não passe de bravata, já que o governo não é obrigado a contratar todos os que se inscreverem. Segundo a Secretaria de Educação do Paraná, o número final dependerá da necessidade de cada região do estado.
Mesmo assim, a APP marcou posição contra a ação de Richa. A coordenadora do Fórum das Entidades Sindicais e secretária de Finanças da APP Sindicato, Marlei Fernandes, qualificou a ação do governo como “perseguição ao movimento” dos professores. “É impossível que o governo consiga contratar 70 mil pessoas. Não existem tantos profissionais assim no mercado.”
Reivindicações
Hermes Leão, por sua vez, disse que o problema não é com o edital de convocação em si, mas com o uso desse mecanismo pelo governo como instrumento para enfraquecer a greve. “Nós consideramos que tanto o edital quanto a tentativa de bloqueio das contas são ataques frontais ao direito de greve”, declarou.
A segunda greve dos professores paranaenses em 2015 completa hoje 38 dias. Somadas, as duas paralisações deste ano totalizam 67 dias. A greve atual foi deflagrada em reação à proposta do governo de retirar do Tesouro e transferir para o fundo de previdência bancado por servidores da ativa o ônus pelo desembolso de mais de R$ 120 milhões por mês para o pagamento de aposentadorias e pensões. Em vez de se abrir ao diálogo, Richa optou por lançar a polícia contra os servidores, o que resultou no chamado Massacre do Centro Cívico, que na última sexta-feira completou um mês.
A alteração pretendida pelo governo na previdência dos servidores passou na Assembleia Legislativa do Paraná (Alep), mas a violência policial e a persistente ofensiva do governo contra os direitos do funcionalismo inviabilizaram qualquer possibilidade de acordo. Hoje, além dos professores das escolas estaduais, diversas outras categorias do funcionalismo estão em greve, dos professores da universidades públicas e agentes penitenciários aos funcionários dos serviços de saúde e da Justiça paranaense, em busca de reposição salarial de 8,17%.
A ofensiva de Richa contra os servidores públicos do Paraná teve início nos primeiros meses de 2015, semanas depois de o governador ter revelado, após sua reeleição em primeiro turno, que havia deixado os cofres públicos do estado à beira do colapso financeiro no último ano de seu primeiro mandato. Desde então, a ofensiva contra os servidores só vem se intensificando por parte do governo. Na semana passada, o governo enviou à Alep proposta por meio da qual compromete-se a pagar este ano aos servidores 3,45% de reajuste em três parcelas de 1,15% cada e, “se houver condições”, antecipar de maio para janeiro de 2016 a data-base dos servidores e reajustar os salários em 8,5%. Os servidores exigem 8,17%, o que apenas repõe a inflação dos 12 meses anteriores à data-base de maio, em parcela única. As categorias em greve rejeitaram a proposta do governo, qualificada por Richa como “irrecusável”, e mantiveram as paralisações.
O governo alega que, se atender à reivindicação dos servidores, ultrapassará o limite prudencial de gastos com pessoal estabelecido pela Lei de Responsabilidade Fiscal. No entanto, um relatório elaborado pelo economista Cid Cordeiro a pedido da APP derruba com números o argumento do governo. A lei estabelece que os Estados não podem comprometer mais de 49% da receita corrente líquida com pessoal e estabelece em 46,55% o chamado limite prudencial. Segundo o cálculo de Cid Cordeiro, no entanto, o Paraná utilizou este ano 45,97% do que arrecadou para cobrir as despesas com folha de servidores ativos, inativos e pensionistas. Além disso, o limite prudencial não pode ser aplicado ao reajuste da data-base dos servidores. “Mesmo que a legislação não permitisse que a reposição da inflação fosse deixada fora deste cálculo, o relatório de Cordeiro demonstra que o estado tem, sim, condições de aplicar a reposição de 8,17% nos salários dos(as) servidores(as). E mais: em uma única parcela e este mês. Não o faz por outras razões”, denuncia a APP por meio de nota.
Na última sexta-feira (29), enquanto isso, a Defensoria Pública do Paraná iniciou uma ação civil por meio da qual pede a condenação do Estado por danos morais coletivos e pagamento de R$ 5 milhões em indenizações às vítimas do Massacre do Centro Cívico. O futuro da ação ainda depende da conclusão da investigação sobre o episódio pelo Ministério Público.