História

Atividade metalúrgica na região de Sorocaba começou em 1589

Metalúrgicos se estabeleceram na região em 1589, seis décadas antes da chegada de Baltazar Fernandes, fundador de Sorocaba

Imprensa SMetal/Paulo Andrade
Arte: Júlio Freire

Simulação da rotina de trabalho em um engenho rústico de ferro, com forno catalão

Mais de 60 anos antes da chegada de Baltazar Fernandes, fundador de Sorocaba, trabalhadores metalúrgicos já forjavam minério de ferro e construíam vilas operárias na região. O primeiro povoado da categoria foi formado no final do século 16, no morro de Araçoiaba. O segundo, no início do século seguinte, onde hoje fica o bairro Itavuvu, zona norte de Sorocaba.

Em 1589, uma expedição liderada pelos Afonso Sardinha, pai e filho, sendo o pai português, conhecido como “o Velho”; e o filho mameluco, chamado de “o Moço”, chegou ao morro de Araçoiaba, onde encontrou farta quantidade de magnetita, que chegava a brotar do solo. Hoje o morro é parte integrante da Floresta Nacional de Ipanema (Flona).

Contando com a mão de obra vinda de São Paulo, de onde também vinham os Sardinha, foram construídos no morro, na região do Vale das Furnas, dois fornos rústicos de fundição, do tipo catalão, e uma forja. A fábrica começou a funcionar em 1591.

Segundo Jackson Marcos Siqueira Campolim, professor de história, pesquisador e guia de visitantes na Flona há 17 anos, os trabalhadores da fundição eram bandeirantes, mamelucos e índios escravizados.

A fundição despertou o interesse do governador geral do Brasil, Dom Francisco de Souza, que visitou o empreendimento em 1598.

No ano seguinte, o governador voltou para o morro e lá se estabeleceu por cerca de seis meses, período em que mandou erguer no local um pelourinho, símbolo da Coroa Portuguesa. O povoado de metalúrgicos foi elevado à condição de vila, com o nome de Nossa Senhora de Monte Serrat do Itapevuçu.

A produção de ferro

Os fornos catalães alcançavam 700 graus centígrados e o minério, além de conter muitas impurezas, não chegava ao estado líquido (O ponto de fusão do ferro é 1.538 °C). O combustível era o carvão obtido da peroba, abundante no morro.

O ferro era refinado com a ajuda de um malho, acionado por uma roda d’água, e moldado em uma forja. Assim eram fabricados arreios, ferramentas e utensílios como facas e colheres.

O engenho de fundição ficava a cerca de três quilômetros, morro acima, do local onde hoje fica a sede da Fazenda Ipanema. A roda d’água era acionada pelo Ribeirão do Ferro.

De acordo com o pesquisador e escritor José Monteiro Salazar (falecido em 2014), cada forno precisava de cinco homens para operá-lo. Havia também outras tarefas relacionadas à produção, como o transporte do minério. Pela estimativa de Jackson, no final do século 16 a fábrica devia contar com o trabalho de aproximadamente 20 homens livres e um número bem maior de escravos índios.

Parte dos moradores da vila também se dedicava à lavoura de subsistência. “Considerando homens, mulheres e crianças, a vila devia contar com várias dezenas de moradores”, avalia Jackson.

Jackson Siqueira: trabalhadores eram bandeirantes mamelucos e índios (foto: Foguinho/Imprensa SMetal)

A Vila no Itavuvu

Nos primeiros anos do século 17, o governador já tinha voltado para a Corte e os Sardinha haviam partido para outras empreitadas. Com a ausência dos empreendedores, os moradores começaram a procurar outros locais para se estabelecerem.

Parte dos metalúrgicos voltou para São Paulo. Outra parcela continuou mantendo a fábrica, que produziu até 1615. Um terceiro grupo mudou-se para “uma região melhor, às margens do Rio Sorocaba, conhecida então como Itavuvu, cerca de 12 quilômetros a leste do Araçoiaba”, conta Salazar em seu livro O “Esconderijo do Sol”, uma das principais referências literárias sobre o assunto.

O povoado do Itavuvu foi reconhecido em 1611 como vila. Ali também a coroa portuguesa autorizou a instalação de um pelourinho e batizou a localidade como Vila São Felipe.

As ruínas dos fornos dos Sardinha foram descobertas em 1977. Já os vestígios da vila operária de Monte Serrat não foram encontrados.

Pelourinho da Avenida Itavuvu, que relembra a vila instalada em 1611 (foto: Foguinho/Imprensa SMetal)

Pelourinho transferido

Em meados do século 17, o capitão bandeirante Baltazar Fernandes aprisionava índios no caminho de Peabiru, que passava pela região de Sorocaba, e foi nomeado proprietário das terras locais pela realeza.

Em 1654, vindo de Santana do Parnaíba, Baltazar mudou-se para a região com familiares e escravos índios e fundou o povoado de Sorocaba. Nessa época, a fábrica de ferro dos Sardinha estava abandonada havia quase quatro décadas.

O povoado fundado pelo bandeirante atraiu antigos habitantes da região, incluindo os moradores remanescentes do Itavuvu, que se deslocaram para locais mais próximos do núcleo de Sorocaba.

Em março de 1661, o povoado de Baltazar foi elevado à Vila de Nossa Senhora da Ponte de Sorocaba. O despacho de fundação permitiu a transferência do pelourinho do Itavuvu, que ficava a 10 km do centro da nova vila.

Atual polo metalúrgico

Hoje os 14 municípios cobertos pelo Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região reúnem 43 mil trabalhadores da categoria, sendo 85% deles na cidade de Sorocaba. Eles estão distribuídos em centenas de fábricas e outras centenas de oficinas, que formam um dos principais polos do setor metal-mecânico no Brasil.

Mas a origem dessa vocação remonta aos metalúrgicos que operavam fornos quase primitivos, no alto de um morro, a duas semanas de viagem da capital da província, a pé e no lombo de mulas, por trilhas antes conhecidas somente pelos tupiniquins.

Iniciativas após os fornos de Afonso Sardinha

Enquanto Baltazar fundava Sorocaba, a Coroa portuguesa voltou a se interessar pelas jazidas de ferro do morro Araçoiaba. Por isso, em 1660 ela proibiu a exploração do local por particulares, sob pena de morte, mas não realizou nenhum empreendimento.

Revogada a proibição, em 1680 os irmãos Moreira Cabral reativaram a produção de ferro no morro. Essa experiência durou cinco anos.

Em 1765, uma sociedade liderada por Domingos Ferreira Pereira construiu outra fábrica de ferro no Araçoiaba, cerca de 3 quilômetros distante do engenho dos Sardinha, seguindo o curso do Ribeirão do Ferro.

A fundição rústica de Domingos durou seis anos. Os motivos do fechamento teriam sido as dificuldades para tirar as impurezas do minério e os altos impostos cobrados pela Coroa.

Em 1785, D. Maria I, a Louca, proibiu a manufatura no Brasil, impedindo qualquer iniciativa fabril que concorresse com produtos portugueses, incluindo o ferro.

A Real Fábrica de Ferro

Em 1808, quando a família real mudou-se para o Brasil, fugindo do exército de Napoleão, o Rei D. João VI ordenou a especialistas que projetassem uma grande siderúrgica na colônia brasileira.

Em 1810, foi criada, por carta régia, no sopé do morro Araçoiaba e próxima ao Rio Ipanema, a Companhia Montanística das Minas Gerais de Sorocaba, que pouco depois foi renomeada Real Fábrica de Ferro de São João de Ipanema.

A represa que atendia à produção foi a primeira do gênero no Brasil.

A fábrica começou a operar com 14 estrangeiros assalariados e muitos escravos negros.

O período da Real Fábrica de Ferro é bem mais conhecido e documentado do que as iniciativas anteriores. A siderúrgica foi desativada em 1895.

Boa parte das construções do século 19, bem como equipamentos utilizados na época, são abertos à visitação. Alguns sítios arqueológicos no morro também podem ser visitados. Porém, somente com acompanhamento de monitor.

No século 16, os principais habitantes da região de Sorocaba eram os tupiniquins, que deram nomes a muitas localidades. A região tem influência das línguas Tupi e Guarani e suas ramificações. Especialistas divergem sobre a junção de vocábulos indígenas que foram transcritos pelos europeus. Por isso há interpretações diferentes sobre o significado de alguns nomes.

Araçoiaba – Esconderijo do sol
Ipanema – Rio imprestável, sem peixes
Itapevuçu – Pedra grande e chata
Peaberu – Caminho pisado, caminho de grama amassada
Iperó – Casca amarga/Águas profundas
Itavuvu/Itapebuçu – Caminho de pedra /
Caminho de pedra preta
Sorocaba – Terra Rasgada

Conheça pessoalmente

Floresta Nacional de Ipanema (Flona Ipanema) – 5.069 hectares • Entrada 1 – Estrada Sorocaba-Iperó • Entrada 2 – Araçoiabinha
• Visitas – De terça a domingo, das 8h às 16h • Preço da entrada – R$ 7 por pessoa • Visitas monitoradas – Taxa mínima de R$ 50 para até 10 pessoas (cada trilha). Acima de 10 pessoas, R$ 5 por pessoa. Os monitores são integrantes da Associação Tupiniquins
• Atrações – Arquitetura histórica na parte baixa, arvorismo e quatro opções de trilhas no morro, incluindo a do sítio arqueológico Afonso Sardinha e a do monumento à Varnhagem (Visconte do Porto Seguro), considerado Pai da História do Brasil, nascido na Fazenda Ipanema • Informações: (15) 3266-9099

Atividade metalúrgica na região de Sorocaba começou em 1589

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