Bolsa Família

93 mil sorocabanos recebem benefício assistencial

Segundo estimativa do IBGE, cerca de 30 mil famílias, o que representa 93 mil pessoas, recebem algum benefício assistencial, seja municipal, estadual ou federal em Sorocaba

Jornal Cruzeiro do Sul/Priscila Fernandes
Fábio Rogério/JCS

Ester Pio (vermelho), Luciana e João Ferreira de Lima

Cerca de 30 mil famílias, o que representa 93 mil pessoas, recebem algum benefício assistencial, seja municipal, estadual ou federal em Sorocaba. Isso representa 14,4% da população total do município, estimada em 644.919 pessoas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os dados são do Cadastro Único (CadÚnico) e foram levantados pela Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social de São Paulo (Seds).

Entre os benefícios concedidos em Sorocaba estão iniciativas para estimular a frequência escolar, garantir a segurança alimentar de crianças e idosos, e auxílio para casais que tiverem filhos gêmeos. Para a secretaria do Estado, “a pobreza deve ser compreendida como um fenômeno multidimensional que transcende a ausência de renda e se manifesta em um conjunto de privações de bens, serviços e oportunidades. Desta forma, o enfrentamento desta situação seria missão de todas as esferas de governo e depende de intervenções simultâneas e integradas, sobretudo no campo da assistência social”.

O acesso aos programas sociais — federais, estaduais e municipais — acontece por meio de inscrição no CadÚnico. O cadastramento e acompanhamento são realizados pelos Centros de Referência da Assistência Social (Cras). Sorocaba possui 30.944 famílias cadastradas no CadÚnico e, desse total, cerca de 14 mil tem o perfil Bolsa Família (famílias com renda por pessoa de até R$ 77 mensais; e famílias com renda por pessoa entre R$ 77,01 e R$ 154 mensais). Cerca de 5.890 famílias (1% dos cadastrados) estão na faixa per capita de até R$ 77, considerados em extrema pobreza.

Transferência de renda

De acordo com dados da Prefeitura de Sorocaba, por meio da Secretaria de Desenvolvimento Social da cidade, atualmente são gastos R$ 1.739.984,00 ao mês com programas de transferência de renda na cidade. Em dezembro de 2015, esse valor era R$ 1.702.398,40, um aumento de 2,2%.

Seriam 13.102 famílias recebendo o Bolsa Família, do Governo Federal, embora 14 mil estejam na faixa de renda com direito ao benefício. O programa de transferência de renda possui diversas exigências aos beneficiados, em relação à saúde e educação (confira abaixo).

Já em relação aos programas estaduais, seriam 176 beneficiários do Ação Jovem (R$ 80 por pessoa). O programa estimula a conclusão da escolaridade, exigindo frequência escolar mínima de 75%. Ainda por meio do Estado, 183 pessoas são auxiliadas pelo Renda Cidadã (R$ 80 por pessoa) e 15 no Renda Cidadã Idoso (R$ 100 por pessoa). A iniciativa oferece apoio financeiro direto às famílias carentes.

O município presta auxílio a 175 famílias beneficiadas pela Lei de Gêmeos, que determina o pagamento mensal do equivalente a 20% do salário mínimo para cada gêmeo, por até 7 anos. Além disso, a cidade mantém convênio com a Associação Bom Pastor, em que 428 adolescentes de 12 a 14 anos de idade recebem R$ 50 ao mês; e 338 adolescentes de 15 a 17 anos de idade, recebem R$ 75 ao mês, cada um.

Outros auxílios

Além da transferência de renda direta, Sorocaba recebe ainda outros auxílios por meio do Governo Estadual: 2.395 crianças são beneficiárias do Programa Vivaleite, sendo que por mês são 35.925 litros de leite distribuídos, com R$ 685.449 investidos na iniciativa em 2016. Ainda no campo da segurança alimentar, a secretaria estadual mantém desde fevereiro de 2006 uma unidade do Bom Prato oferecendo diariamente 300 cafés da manhã a R$ 0,50 e 1.300 almoços a R$ 1.

Sorocaba tem ainda mais 5.838 pessoas recebendo o Benefício de Prestação Continuada (BPC), que garante a transferência de um salário mínimo à pessoa idosa com 65 anos ou mais, e à pessoa com deficiência de qualquer idade, que comprovem não possuírem meios de se sustentar ou de serem sustentados pela família.

Família vivia de pedir mantimentos na rua

Em um barraco de madeira no meio do mato, no Jardim dos Eucaliptos, onde só se chega atravessando um córrego e passando por cima de pontes e caminhos improvisados, Luciana Pio de Lima, de 24 anos, vive com sua família. A única renda, que garante o sustento dos seis moradores — incluindo duas crianças–, é o benefício de R$ 386 do Bolsa Família e o cartão alimentação da Prefeitura, no valor de R$ 100. A situação, por incrível que pareça, é uma conquista obtida pela família em março, pois antes viviam com os mantimentos que conseguissem obter pedindo pela cidade. Com o valor dos benefícios, adquirem artigos básicos, como alimentos e fraldas. “Agora dá até para comprar mistura”, comemorou Luciana.

Desde o primeiro contato com Luciana, no dia 24 de junho, chamava a atenção que, apesar das dificuldades, ela não deixava de exibir um sorriso tímido no rosto e a todo tempo agradecia pela saúde dos membros da família, inclusive do pai: João Ferreira de Lima, 65 anos, que sofreu dois derrames há alguns meses, ficando com dificuldades de locomoção. Antes disso, ele trabalhava como vigia em um prédio, mas agora luta para conseguir a aposentadoria.

Até o dia que a reportagem esteve no local, a maior dificuldade de João — que recebe atendimento no barraco, feito por uma equipe de Médicos da Família — era quando precisava sair de sua moradia. Para fazer exames, tinha de atravessar o córrego, e nos dias de chuva isso se tornava impossível pois o local alagava e não tinha como fazer a travessia.

O problema da moradia também gerava, até aquela data, outras dificuldades para a família, formada pelo pai, a mãe, o irmão e duas filhas de Luciana, uma de 5 anos e outra de 7 meses. Segundo ela, procurar um emprego, sem endereço, não é tarefa fácil. “E eu ainda teria que faltar alguns dias, porque quando chove aqui, não tem condições de sair”, explicou. A moça, que estudou até a oitava série, já trabalhou em uma cooperativa de reciclagem e como doméstica, mas nunca teve a carteira assinada. Seus maiores sonhos: “trabalhar e ter minha casa, mais nada”. A mãe de Luciana, Ester Pio, 53 anos, lamentava a dificuldade para encontrar um emprego. “Acho que é a crise”, disse. Para piorar, a família apenas ocupava o barraco, que seria de outra pessoa, que o emprestava.

Essa história, porém, teve um novo revés, dias após a reportagem visitar a família. A sorte sorriu para Luciana na manhã de quarta-feira (29), quando ela foi uma das sorteadas para ocupar um dos 500 apartamentos remanescentes do Residencial Jardim Altos do Ipanema 2, projeto habitacional da Prefeitura de Sorocaba. Ela conta que foi ao Ginásio Municipal de Sorocaba acompanhar o sorteio repleta de esperança. “Eu pulei de alegria”, revelou a moça. Ansiosa para deixar para trás as dificuldades do barraco, Luciana faz planos. “Agora é vida nova”, afirmou.

1.054 famílias deixaram de receber auxílio

Desde o início do ano, 1.054 famílias deixaram de receber o Bolsa Família em Sorocaba. De acordo com Secretaria de Desenvolvimento Social (Sedes), 646 não precisavam mais do benefício, enquanto os 408 restantes tiveram o auxílio cancelado por conta do não cumprimento das exigências do programa, como frequência escolar das crianças e acompanhamento médico. Apesar dessas deixas, o número de beneficiários na cidade registra aumento de 4,18% neste ano, visto que passou a atender 1.576 novas famílias em 2016. Ao todo, são 13.102 beneficiários no município.

Os participantes do Bolsa Família são acompanhados pelas Sedes e devem cumprir uma série de condicionalidades, sob o risco de punições gradativas, como bloqueio e suspensão do auxílio, até o cancelamento. Segundo a Secretaria, com base em informações do mês de maio de 2016, existem 72 famílias sem receber (bloqueio ou suspensão) o benefício, por descumprimento das exigências. Desse total, 43 famílias correm o risco de ter seu benefício cancelado no mês de julho, caso continuem a descumprir as regras do programa do governo federal.

Condições

Na área da educação, os beneficiários devem matricular as crianças e os adolescentes de 6 a 17 anos na escola, além disso a frequência escolar deve ser de, pelo menos, 85% das aulas para crianças e adolescentes de 6 a 15 anos e de 75% para jovens de 16 e 17 anos, todo mês. Na área de saúde, os responsáveis devem levar as crianças menores de 7 anos para tomar as vacinas recomendadas pelas equipes de saúde e para pesar, medir e fazer o acompanhamento do crescimento e do desenvolvimento; enquanto as gestantes devem fazer o pré-natal e ir às consultas na Unidade de Saúde. Já na área de assistência social, os responsáveis devem manter seus dados cadastrais atualizados, informando para a gestão municipal qualquer mudança nas características da família.

De acordo com a Sedes, é muito importante que os beneficiários compareçam às Unidades Básicas de Saúde duas vezes ao ano. A primeira em qualquer mês entre janeiro e junho, e a segunda entre os meses de julho e dezembro. Neste dia, deverão estar presentes para o atendimento os meninos, de 0 a 7 anos, e todas as mulheres da família, com idade abaixo de 44 anos.

Para socióloga, benefícios são segurança e perspectiva de futuro

Os maiores benefícios dos programas sociais são a segurança e a perspectiva de futuro que criam para os assistidos. A opinião é da socióloga e professora da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Carolina Raquel Duarte de Mello Justo, que estuda o tema.

A especialista acredita que, para quem vive sob condições muito precárias de trabalho, entre elas a instabilidade, uma renda fixa pode mudar a perspectiva. “Permite a essas pessoas e famílias planejarem a vida, criarem expectativas, passarem a enxergar e a construir um futuro para si e as próximas gerações”, explica. Outro ponto positivo seria o maior acesso aos serviços de saúde e educação. “É efetivamente um ganho de cidadania”, afirma.

Estigmas e preconceitos

Para a socióloga, o preconceito contra os beneficiários de programas sociais se sustenta em dois aspectos: a forma como as pessoas enxergam o trabalho nos dias de hoje e a maneira como são vistas as pessoas mais pobres. “Até há cerca de 125 anos atrás, o trabalho no Brasil era visto de modo negativo, atribuição obrigatória dos escravos. De lá para cá, foi adotado o trabalho assalariado e, com ele, uma valoração muito positiva do trabalho”, explicou. Desde então, trabalhar passou a ser encarado como o passaporte para a cidadania, que enobrece o homem e dá sentido à vida. Embora roubar e mendigar sejam consideradas formas indignas de obter dinheiro, ganhar na loteria, receber heranças e aluguéis de imóveis são bem vistos, mesmo que a pessoa não trabalhe. “É aí que entra o preconceito quanto à pobreza”, explica.

Carolina acredita que as pessoas têm uma visão distorcida dos mais pobres. “É sempre o outro que é folgado, preguiçoso, espertalhão, que não gosta de trabalhar. Só que esse outro aí eu nunca encontrei nas minhas pesquisas”, afirma. Concretamente, as pessoas estariam sempre procurando emprego, inclusive os mais precários e degradantes. Os raros que não o fazem, estariam em tal condição de vulnerabilidade em que a própria vida perdeu o sentido.

Apesar dos preconceitos, a socióloga crê que os programas sociais continuarão desenvolvendo papel importante. “Na minha opinião, estamos vivendo o processo de criação de um novo direito, que é o direito à renda, e acredito que, no futuro, o benefício de um programa de transferência de renda não será mais questionado, assim como hoje não se questiona o direito à saúde ou à educação”, afirmou.

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