Em troca do apoio do Centrão no Congresso Nacional, o presidente Jair Bolsonaro (ex-PSL) criou, no final de 2020, um orçamento secreto com cerca de R$ 3 bilhões em emendas que beneficiam especialmente os parlamentares que apoiaram os candidatos do governo nas eleições para as presidências da Câmara (Arthur Lira, do PP de Alagoas) e do Senado (Rodrigo Pacheco, do DEM de Minas Gerais), releva reportagem exclusiva do jornalista Breno Pires, do jornal o Estado de S. Paulo.
Entre os que mais conseguiram recursos do esquema que turbinou as verbas que os parlamentares têm direito de enviar às suas bases eleitorais para ações voltadas a atender prefeituras e associações aliadas, está o ex-presidente do Senado Davi Alcolumbre (DEM-AP), um dos mandachuvas do Bolsolão, como o esquema denunciado está sendo chamado nas redes sociais.
Todos os anos, os parlamentares têm direito a indicar, no máximo, R$ 8 milhões, cada um, para bancar suas emendas. O valor corresponde à metade da cota total de emendas impositivas individuais que deputados e senadores têm direito a enviar. A outra metade deve ir, obrigatoriamente, para a saúde. Essa regra vale para todos os 513 deputados e 81 senadores.
Com o Bolsolão, só Alcolumbre determinou a aplicação de R$ 277 milhões de verbas públicas do Ministério do Desenvolvimento Regional. Mandou mais que o ministro Rogério Marinho. Se fosse liberar a verba pelas vias convencionais, o ex-presidente do Senado levaria 34 anos, já que cada parlamentar tem direito a direcionar apenas R$ 8 milhões ao ano, aponta a reportagem.
Alcolumbre enviou R$ 81 milhões à Codevasf, estatal sob seu controle. Os documentos ainda mostram que o senador destinou R$ 10 milhões para obras e compras fora do Amapá. As máquinas seriam destinadas a prefeituras para auxiliar nas obras em estradas nas áreas rurais e vias urbanas e também nos projetos de cooperativas da agricultura familiar no Paraná.
As reportagens revelam que o Bolsolão comprou tratores e equipamentos agrícolas por valores até 259% acima do preço de referência no mercado. Os dados do esquema, semelhante ao dos Anões do Orçamento – grupo de congressistas que, entre 1980 e 1990, fraudaram recursos do Orçamento da União -, foram encontrados em 101 ofícios enviados por deputados e senadores ao Ministério do Desenvolvimento Regional. Esses ofícios, de acordo com o jornalista, mostram que esse esquema também atropela leis orçamentárias, já que são os ministros e não os parlamentares que deveriam definir onde aplicar os recursos.
O esquema atropelou pelo menos três itens da Lei das Diretrizes Orçamentárias (LDO) e posições assumidas por Bolsonaro na campanha campanha e já no exercício do mandatom diz o repórter Breno Pires: 1) a lei determina que sejam estebelecidos critérios para definição das localidades beneficiadas; 2) sejam apresentados indicadores socioeconômicos ao distribuir os recursos; e, 3) os recursos devem priorizar a continuidade de obras iniciadas.
O Bolsolão, segundo o Estadão, turbinou a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), estatal loteada pelo Centrão. O grupo vai aplicar cerca de um terço dos recursos repassados por imposição dos políticos que a controlam. O jornal lembra que a Codevasf foi criada durante a ditadura militar e tem uma história marcada por corrupção e fisiologismo. Neste ano, conseguiu um orçamento recorde de R$ 2,73 bilhões, composto principalmente por emendas, mas o governo fez cortes, diz a reportagem.
Os mandachuvas do Bolsolão
Além de Alcolumbre, os outros mandachuvas do Bolsolão são o presidente do PP e líder da tropa de choque bolsonarista na CPI da Covid Ciro Nogueira, e a secretária de Governo de Bolsonaro, Flávia Arruda (PL-DF), ainda segundo o Estadão. Outros membros do esquema já identificados são os deputados: Lúcio Mosquini (MDB-RO), Ottaci Nascimento (SD-RR), Bosco Saraiva (SD-AM) Rodrigo Cunha (PSDB-AL) e Vicentinho Junior (PL-TO).
Para a colunista Rosângela Bittar, a série de reportagens do jornalista Breno Pires sobre “verbas secretas, superfaturamento, direcionamento de valores acima da referência para aquisição de determinados itens do cancioneiro parlamentar, como tratores e retroescavadeiras”, nada mais é do que “um clássico da corrupção com recursos do Orçamento Federal”.